A sociedade moderna possui metas cada vez mais dependentes de propriedades específicas de materiais. Queremos baterias cada vez mais eficientes para nossos carros e smartphones, necessitando de um material com elevada densidade de energia. Queremos matrizes energéticas mais sustentáveis, exigindo, por exemplo, materiais que sejam mais eficientes na conversão de luz solar para energia elétrica e assim por diante. Propriedades tão específicas são normalmente encontradas em apenas um seleto grupo de materiais, que muitas vezes nem sequer foram descobertos ainda. A partir do fato de que frequentemente conhecemos a necessidade, a propriedade alvo desejada, mas não o material que a possua, uma nova abordagem para a engenharia de materiais foi desenvolvida: o design inverso.
Esquema hierárquico para o desenvolvimento de novos materiais por estratégia direta e inversa. Fonte: Brito, 2016.
Em vez de considerar cada material e definir suas propriedades, o design inverso funciona de forma que dada uma propriedade, seja encontrado o material adequado, como esquematizado na figura. Isso se deve ao fato de que realizar testes laboratoriais em diversos arranjos de materiais possíveis seria extremamente ineficiente, considerando a grande gama de combinações possíveis que precisariam ser testadas para atingir cada uma das propriedades alvo. Assim, devido ao avanço no desempenho computacional, inverteu-se a sequência de trabalho e começou-se a usar técnicas de simulação como Dinâmica Molecular, Monte Carlo e Teoria do Funcional de Densidade para analisar diversas combinações de materiais e arranjos moleculares e verificar qual deles atende aos requisitos desejados. A partir da distribuição dos estados energéticos dos elétrons de um material, por exemplo, é possível estimar suas propriedades elétricas, estrutura cristalina, temperatura de fusão, reatividade química, módulo de elasticidade, entre outras propriedades. Devido a isso e ao estudo das interações de partículas fundamentais da matéria, como núcleos atômicos e elétrons, é possível descrever características macroscópicas de materiais por meio de design inverso. A abordagem escolhida para isso depende fortemente dos recursos computacionais disponíveis para a sua execução.
Exemplos de aplicações:
– Germânio e silício são semicondutores que possuem gaps indiretos. A partir do teste de diferentes sequências de sobreposição de camadas atômicas desses elementos por design inverso, descobriu-se uma “sequência mágica”, SiGe2Si2Ge2SiGen, cujo gap entre bandas é direto, possibilitando uma absorção muito maior de luz. O mesmo poderia ser feito experimentalmente, no entanto com baixíssimas possibilidades de sucesso, considerando que a sequência foi escolhida dentro de um grupo de 2^40 combinações possíveis.
– Vários materiais da família ABX nunca haviam sido produzidos antes, mesmo sendo estáveis. O design inverso permitiu recentemente a descoberta de 17 deles: HfIrSb, ZrIrSb, TaIrSn, TaIrGe, TiIrSb, HfRhP, VIrSi, ZrIrBi, ZrRhBi, ZrNiPb, TiIrP, VRhSi, ScPtBi, ZrPdPb, TaCoSn, ScRhTe e ScPdP. Um deles, o TaIrGe, mostrou-se ser um condutor transparente com um gap largo entre bandas, cujo valor é de aproximadamente 3 eV. Isso foi uma surpresa, já que iridetos não são normalmente associados a gaps largos.
– Estruturas jamais pensadas podem agora ser sintetizadas – é uma revolução na arquitetura de partículas. Um exemplo um pouco intrigante é a estrutura conhecida como “queijo suíço”. Para desenvolvê-la, parte-se de uma matriz e de poros esféricos e organiza-se os mesmos de uma forma um tanto inconvencional – os poros são posicionados de forma a gerar um arranjo cristalino enquanto as partículas ficam em volta dos mesmos em um estado desordenado, amorfo.
E você? Conhece algum caso de aplicação de design inverso que queira compartilhar?
Referências:
Materials Today – New inverse design strategy creates novel materials in reverse;