#2 Conversa com engenheiro: Gabriel Nunes (TNS)

Hoje trazemos a segunda publicação da série Conversa com Engenheiro. No primeiro post, entrevistamos Guilhermino Fechine, pesquisador do Centro de Pesquisa Avançadas em Grafeno e Nanomateriais – Mackgraphe. Hoje o entrevistado é Gabriel Nunes, sócio e diretor executivo da TNS Nanotecnologia, empresa que ganhou recentemente o 19° Prêmio Nacional de Empreendedorismo Inovador na categoria Melhor Empresa Incubada.

Biografia: Gabriel Nunes é engenheiro de materiais com graduação sanduíche na Alemanha, onde atuou em diferentes publicações de artigos científicos e publicação de um livro na área de compósitos aeroespaciais. Ex membro fundador da equipe campeã brasileira no 1o desafio solar Brasil – 09, membro da equipe que recebeu o prêmio de melhor trabalho de cooperação entre Brasil e Alemanha pelo IBE – Institute for Studies Brazil Europe – 11. Atualmente é sócio, e diretor executivo da TNS, onde atua com uma equipe multidisciplinar que executa diferentes projetos de consultoria e desenvolvimento de produtos na área de engenharia e nanotecnologia. A empresa possui iniciativas em todo Brasil, parte da Europa e América latina. Esta atuação fomentou convites para palestrar sobre gestão da inovação, nanotecnologia e empreendedorismo em todo o Brasil. Como últimos reconhecimentos, foi contemplado com o prêmio Stemmer de inovação em SC – 14, e membro da etapa nacional do programa de empreendedores promessas Endeavor – 15.

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1. A prata nanoparticulada é um material muito utilizado em produtos antibacterianos. Quais características que tornam estas nanopartículas aditivos interessantes para esta aplicação? Existem hoje opções mais baratas ou mais eficazes do que as nanopartículas de prata?

Um dos principais motivos para se utilizar a prata é por ela já ter sido utilizada como um antimicrobiano há milhares de anos de atrás. Utensílios domésticos eram feitos de prata, por exemplo, não somente por serem belos, mas justamente porque a prata consegue aniquilar microorganismos patogênicos – propriedades intrínsecas. Nosso diferencial foi basicamente aplicar o conceito da nanotecnologia, de forma a produzi-la via botton-up, ou seja, por uma reação química que isola a quantidade de átomos ideal para a aplicação, encapsula a prata em forma de nanopartículas e a incorpora em diferentes produtos. Utilizamos também o óxido de zinco, pois dependendo da aplicação (por ser óxido) ele é mais estável do que a prata, além de não ser nanoparticulado, mas sim microparticulado.  A escolha do material varia muito de acordo com o mercado, como hoje atuamos em 6 segmentos diferentes às vezes fazemos um mix desses dois produtos em diferentes bases para aniquilar certos microorganismos. Não temos produto de prateleira, nós customizamos de acordo com a aplicação e com a demanda do cliente.

2. Quais são as novidades nas quais vocês vem trabalhando?

Nosso produto mais novo é o revelador de doenças para felinos. Produto que não vem da nanotecnologia, mas sim da biotecnologia. Em 2013, em conversa com alguns clientes da linha médico-hospitalar para veterinário, vimos um potencial para desenvolver um revelador de doenças, o que já era uma tendência no mercado norte-americano. Com isso, começamos a manipular moléculas químicas que variam a colorimetria de acordo com a concentração de proteína no sistema. À partir disso, começamos a incorporar esse produto em areias de maneira geral (bentonita, sílica, diatomita), onde os gatos urinam. Com a alteração de cor dessas areias onde eles urinam, pode-se identificar prematuramente a presença ou ausência de doença renal em um felino. Ainda nesse mês foi feita a produção semi-industrial desse produto que em breve estará no mercado, acredito que ainda em 2015.

Também desenvolvemos um tecido anti-acne para aplicações específicas em fronhas e capacetes, onde o usuário fica em contato direto com essas nanopartículas do tecido, permitindo que atuem direto em bactérias causadoras da acne. Com o tempo, pretendemos combater a acne do rosto durante o sono, ou até mesmo durante um passeio de motocicleta.

3. Como é o mercado de nanotecnologia no Brasil e como nosso país está hoje no cenário mundial? Já existem muitas empresas e investimento no ramo?

Existem muitas empresas de nanotecnologia, pois é uma tecnologia transversal, então muitas empresas químicas, ou de eletrônicos, materiais cerâmicos, polímeros para borrachas especiais e ligas metálicas, estão nascendo diariamente. Por um lado isso é muito bom, porque quanto mais empresas de nanotecnologia, mais ela acaba se difundindo no mercado. O Brasil está muito aquém para podermos dizer que é um país que investe fortemente nessa área. O investimento público em 2014 foi modesto, com poucos editais de subvenção e apoio à inovação, além de projetos de lei que tendem a ultraburocratizar a inovação no Brasil e na nanotecnologia. Felizmente nos poucos projetos de subvenção que foram lançados, a TNS conseguiu obter algumas aprovações estratégicas. Quanto ao investimento privado, tem muitos grupos de venture capital olhando para a nanotecnologia. Dinheiro privado digamos que sobra, o que falta são empresas competentes para receber essa capitalização.

4. Você considera este campo promissor para a engenharia de materiais nos próximos anos?

Já é hoje! Estive visitando a UFRJ, onde há uma pós graduação em nanotecnologia, e é o ecossistema é sensacional. Com investimento direto em pesquisa, em aplicação. Também há a UFSCar e a própria UFSC que possuem diferentes iniciativas de pesquisas nessas áreas, onde estes podem contar com a rede SisNano e o laboratório LINDEN, ambos incríveis. Acho que quem busca por inovação, por fazer algo diferente na área de materiais que seja realmente aplicado no mercado, deve olhar estrategicamente para a nanotecnologia.  Aqui existem oportunidades que nem se imagina serem possíveis de por em prática.

5. No ramo de engenharia geralmente exige um grande investimento inicial para a obtenção de equipamento para a empresa. Como foi esse processo na TNS?

Não sou fundador da TNS, a empresa nasceu de um prêmio Sinapse da Inovação em 2009. Então lá no início, além do capital dos meus sócios a TNS teve alguns prêmios de subvenção que certamente ajudaram e impulsionaram muito o início da empresa. Nós temos um modelo de produção outsourcing, então nossas produções industriais são todas terceirizadas. O que nós temos de estrutura é o escritório e laboratório de pesquisas, além disso nossa equipe é bastante enxuta, com engenharia e química, além de uma equipe de inteligência de mercado. Então nossos investimentos são investimentos a nível de pesquisa e comercial.

6. Como foi a transição para você de recém-formado para empreendedor?

Isso eu estou descobrindo ainda. Eu entrei como estagiário em 2011, logo após um programa de graduação sanduíche na Alemanha. Naquela época eu tinha uma bolsa de doutorado aprovada nos Estados Unidos, mais precisamente em Illinois. Como tinha algumas disciplinas para finalizar no Brasil, topei ficar seis meses na TNS para ver como era o ecossistema de uma startup antes de ir para os EUA. Quando eu decidi sair, meus sócios me ofereceram uma vaga na empresa, onde não aceitei. Após algumas conversas, a única maneira de eu permanecer na empresa, foi me tornando sócio da TNS. Recebi a oportunidade de adquirir uma pequena fatia da empresa, em forma de cotas. Acabei comprando algumas cotas da empresa, onde a mesma na  época não exercia ação comercial, portanto decidi tomar os primeiros passos como empreendedor e arrisquei. Durante a graduação o que me ajudou muito foi poder  participar do centro acadêmico, empresa júnior, porém um grande diferencial foi ser co-fundador do barco solar da UFSC, o Vento Sul. O trabalho em equipe, resiliência e flexibilidade nos permitiram iniciar um business, gerenciar a equipe e a fabricar um barco, tudo isso dentro de uma competição onde buscávamos ser os melhores, exatamente o dia-a-dia da TNS. Fora isso eu sempre fui muito curioso, e com inúmeras atividades em paralelo, realmente aproveitei todas as oportunidades da graduação.

Obviamente eu tinha um sonho, como a grande maioria dos acadêmicos da engenharia de materiais, eu tentaria fazer um trainee numa empresa super legal, me tornar lá na frente um executivo, sair e prestar consultoria… essa era a minha ideia principal. Depois surgiu a oportunidade de doutorado, não era muito o que eu queria, mas naquele momento eu só queria sair do Brasil, não queria mais ficar aqui.

A oportunidade e o desafio de empreender, foram imprescindíveis para que eu não voltasse para o exterior, estes foram os principais motivadores para eu deixar a oportunidade de trainee, de morar fora novamente e de fazer um doutorado para ficar no Brasil. O que eu digo sobre empreender, é que é muito prazeroso, e desafiador. Você basicamente não tem hora para fazer nada, acorda mega cedo, vai dormir mega tarde e no outro dia você acorda mega cedo de novo, geralmente super empolgado, então você realmente tem que ter uma motivação extra que é a paixão pelo o negócio. É incrível como quase todo dia parece uma montanha russa, altos e baixos fazem parte da nossa “rotina”. Como um velho ditado “não tem almoço grátis”. Empreender é difícil, ser empreendedor no Brasil deve-se multiplicar isso por 10. De maneira geral, os inúmeros entraves que temos aqui no Brasil só dão força para você ir atrás do seu objetivo, este que é fazer parte de uma empresa de sucesso, deixar um legado e ser referência no tema. A oportunidade é incrível, eu recomendo para todos que tiverem um pouquinho de vontade: regue bastante essa pequena vontade para que um dia você possa ter iniciativa e executar sua ideia, certamente com disciplina e força de vontade você terá grande chance de criar algo diferente, criar uma empresa e deixar um legado.

7. Qual conselho poderia dar para aqueles que hoje terminam a graduação e pretendem seguir este mesmo caminho?

O que eu sempre faço e parece que está dando certo é pegar um problema/desafio bem grande e dividir ele em diversas partes, obviamente não esquecer de estabelecer metas, podem ser pequenas, para serem validadas a cada dois ou três dias. Em algumas etapas é algo que funciona muito bem, leio isso em vários locais e realmente funciona. Outra coisa importante é estar cercado de pessoas interessantes. Se você quer ser empreendedor é incrível esta verdade, inicialmente você verá muita gente dizendo que você é maluco, para você não fazer isso ou aquilo. Lembro de muita gente falando isso lá em 2012 quando eu entrei para o quadro societário. Na verdade poucos têm a oportunidade, então poucos querem que você dê certo. Se alguém te chamou de louco ou se alguém riu de você no primeiro momento, este é o principal indicador para você acreditar que algo tende a dar certo. Esteja pronto, porque você vai sofrer muito, você verá vários de seus colegas disparando na carreira e você ali com o seu computador na BU (Biblioteca Universitária) estudando e fazendo planos. Diferentes pessoas retornando os estudos no exterior, e você nos primeiros meses e semestres tentando entender as explicações dos problemas que vão surgindo na empresa. Eu presenciei logo no primeiro ano de empresa um desenvolvimento de uma consultoria com uma empresa multinacional muito interessante, foi incrível, consegui visualizar o dia-a-dia em uma grande empresa, entender como alguns processos são travados e certamente tive uma oportunidade ímpar de como desenvolver e oferecer uma consultoria técnica para o mercado. Como eu disse antes, nada disso sozinho, e sim com pessoas inteligentes, pessoas que somam caminhando junto.

Um projeto bem executado com a indústria, independente do sucesso técnico muitas vezes agrega mais em sua carreira do que um MBA convencional que é oferecido de maneira descontrolada no Brasil.

Você deve prender a respiração, colocar a faca nos dentes, ter brilho nos olhos e saber que vai sofrer. No início fui contra alguns o posicionamento de alguns amigos, e parte da família, mas hoje não me arrependo de nada, se eu tivesse que voltar a fazer, eu faria tudo da mesma maneira desde o início, salvo algumas coisinhas que eu aprendi no meio da carreira, segue um compilation: divida as tarefas, tenha pessoas boas do seu lado e sonhe grande. “Vou começar com esse negocinho que é pequeno, daí vou aprender e chegar no grande”, isso é errado! Arrisque-se! Se você não confiar no seu próprio negócio, não pode vender nem para o pequeno nem para o grande. Estude, prepare-se, pois o cavalo encilhado não passa duas vezes no mesmo lugar. E se tiver que atacar, ataca o grande, pois é ali que está a emoção.


Gostaríamos de agradecer ao Gabriel por ter disponibilizado um tempo para conversar conosco em meio a sua rotina corrida de empreendedor e por ter compartilhado com todos nós sua experiência e conhecimento.

Ficou com vontade de saber mais sobre nanotecnologia? Reveja algumas publicações:

Dispositivos eletrônicos flexíveis a partir de nanotubos de carbono;

Superplásticos com nanopartículas de argila;

Nanomateriais transportadores de medicamentos;

Por onde anda o grafeno;

Metais hidrofóbicos a partir de lasers.

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